Protocolo para limpeza de fígado e vesícula evita doenças? – 01/07/2020

Já há algum tempo, circula na internet e em grupos de WhatsApp um protocolo de limpeza de fígado e vesícula que promete eliminar cálculos biliares por meio das fezes, de forma indolor, após uma semana de ingestão de suco de maçã, sulfato de magnésio, azeite de oliva e frutas cítricas. Para quem é adepto do método, más notícias: além de não haver comprovação científica da sua eficácia —muito pelo contrário—, ele pode ser prejudicial à saúde.

O que prega o protocolo?

Esse programa é originário do livro “Limpeza do Fígado e da Vesícula – uma poderosa ferramenta para melhorar sua saúde, seu bem-estar e muito mais”, escrito pelo naturopata alemão Andreas Moritz e lançado em 2003.

O que o autor prega é que as pedras que se formam na vesícula são responsáveis por uma série de problemas —dos mais simples aos mais graves—, como os de pele, dores em geral, fadiga, artrite, diabetes e até câncer, e precisam ser eliminadas do organismo.

A sua receita, para isso, é uma dieta detox, na qual, durante uma semana, deve-se beber 1 litro suco de maçã diariamente, muita água, consumir alimentos e bebidas mornos ou em temperatura ambiente —e só os permitidos—, evitar carnes, laticínios, frituras, gorduras, açúcar e produtos industrializados, comer em pequenas quantidades e tomar apenas os remédios essenciais.

No sexto dia, a partir das 13h30, é preciso suspender a alimentação, mas mantendo a ingestão de água e ingerir, em horários predeterminados, sulfato de magnésio diluído em água e também uma mistura de azeite com frutas cítricas. No último dia do protocolo, após às 13h, pode-se voltar com os alimentos.

O resultado disso tudo, afirma Moritz em seu livro, é a eliminação dos cálculos biliares através das fezes. Apesar disso, em 2005, Christiaan W. Sies, do Canterbury Health Laboratories, e Jim Brooker, do Hospital Waikato, ambos da Nova Zelândia, resolveram investigar o assunto e constataram que o material expelido é resultado de uma reação química, chamada saponificação, ocorrida quando a fórmula ingerida se encontra com as enzimas digestivas.

Em um artigo publicado no jornal científico The Lancet, os pesquisadores garantiram que o que os adeptos do protocolo expelem não são os cálculos biliares, mas sim resíduos do que foi consumido (maçã, azeite e frutas cítricas). Eles também explicaram que o sulfato de magnésio auxilia na saída. “Mostramos que esses regimes de descarga para expulsar cálculos biliares são um mito e que as alegações feitas por alguns são enganosas”, dizem em um trecho do texto.

Fígado e vesícula não precisam de limpeza

Localizado do lado direito do abdome, o fígado tem como uma de suas funções secretar a bile, líquido resultante da mistura de várias substâncias, entre elas o colesterol, e que atua na digestão de gorduras. A vesícula, por sua vez, encontrada logo abaixo do lobo direito do fígado, funciona como um reservatório de bile.

Quando ocorre um desequilíbrio nesse fluído (excesso de colesterol em relação aos seus solubilizantes ou acúmulo de bilirrubina) ou, então, quando a vesícula biliar não se esvazia por completo frequentemente, podem surgir os tais cálculos biliares.

Essa condição é mais comum em obesos e mulheres com idade acima de 40 anos e que tiveram mais de uma gravidez. A herança genética também é um fator de contribuição, assim como certas doenças (diabetes, colestase familiar e fibrose hepática congênita, por exemplo), dieta rica em gorduras e carboidratos e pobre em fibras, vida sedentária e níveis elevados de colesterol.

De acordo com os especialistas consultados por VivaBem, grande parte das pedras é assintomática ou provoca um leve desconforto após a ingestão de alimentos gordurosos. Em casos agudos, as queixas são dor intensa do lado direito do abdome e que irradia para as costas, perto da escápula, náuseas, vômitos e diarreia.

As situações mais graves se dão quando os cálculos conseguem sair da vesícula e acabam presos em algum dos canais ao longo do caminho até o intestino. Na lista das principais complicações estão: colecistite (inflamação da vesícula), obstrução intestinal, colangite (inflamação de um ou mais canais biliares) e, a pior, pancreatite (inflamação do pâncreas), que pode ser fatal.

Pois é justamente para evitar que isso aconteça que os tratamentos caseiros, como o desenvolvido pelo naturopata Andreas Moritz, são contraindicados. E neste protocolo específico, destacam os profissionais, por ser bastante restritivo e pregar o jejum prolongado, ainda existe a possibilidade de seus adeptos apresentarem carência de nutrientes e desenvolverem lesões no fígado ou piora de algum quadro preexistente.

Por exemplo, uma pessoa obesa ou com sobrepeso, com esteatose hepática e alterações de glicemia, colesterol e triglicerídeos, pode ter elevação das enzimas hepáticas e depósito de gordura no fígado. Fora isso, dependendo das condições de saúde e dos medicamentos que se esteja utilizando, há o risco de queda na taxa de glicose do sangue (hipoglicemia), com prejuízos para o organismo.

O fato é que fígado e vesícula não necessitam de nenhum tipo de limpeza, mas, sim, de hábitos saudáveis: dieta equilibrada, rica em fibras e pobre em gorduras, açúcares e carboidratos, e feita em intervalos regulares; baixo consumo de bebida alcoólica; não uso de medicamentos desnecessários, ou seja, sem prescrição médica; prática de atividade física e boa hidratação.

Fontes: Durval Ribas Filho, nutrólogo e presidente da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia); Marisa Diniz, nutricionista do Hospital Leforte Liberdade; Nilma Ruffeil, gastroenterologista e hepatologista do Hospital Moriah e do ambulatório de esteatose hepática da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e Vivian Rotman, médica do serviço de hepatologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

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